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EX-JOGADOR

"Vi o fogo vindo na minha direção", relata ex-zagueiro Lúcio sobre acidente com lareira

Pentacampeão conta detalhes do episódio traumático que vivenciou na casa de amigo e da internação no hospital

Estava tudo tranquilo naquela noite. Fomos jantar em Brasília a convite de um amigo. Éramos quatro: eu, minha esposa, Marília, e um casal de amigos. Estávamos sentados ao redor de uma lareira ecológica, na varanda da casa, conversando e comendo pinhão, um alimento típico do Sul. Tudo estava normal, até que a lareira apagou.

Nosso amigo, o anfitrião, teve uma atitude muito imprudente, infelizmente. Assim que a chama se apagou, ele pegou um galão de álcool para reacender. Um galão grande, de cinco litros. Só o ouvi falando: "Vamos acender". Estava de costas para mim, do meu lado, e virou o galão sobre a lareira. A explosão aconteceu imediatamente.

Foi violento. Entrei em paralisia. Vi o fogo vindo na minha direção. Todos estávamos muito próximos da lareira, mas como ele jogou o álcool virado para o meu lado, fui o mais atingido.

Minha esposa estava a cerca de cinco centímetros de mim. Ela não se queimou, e acredito que foi uma providência divina. Ela manteve a calma, chamou o SAMU e me socorreu. Como a ambulância demoraria, me levou de carro ao hospital. Mas antes disso, foi ela quem me disse para pular na piscina, que ficava ali na varanda. Eu estava em chamas, sem entender muito bem o que estava acontecendo. Ela gritou: "Amor, vai para a piscina!" Dei cinco ou seis os e pulei.

 

Fiquei sentado dentro d'água, com o corpo submerso. Isso ajudou a apagar o fogo e diminuir a gravidade das queimaduras. Ela tentou orientar os outros a fazerem o mesmo, mas todos estavam em pânico. Meu amigo teve medo de as feridas infeccionarem por causa do cloro. Então ela usou uma toalha molhada para aliviar as queimaduras deles.

Fomos ao hospital, no carro dela. Eu ainda não tinha noção da gravidade. Pela adrenalina, achei que apenas os braços estavam feridos. Mas quando os médicos cortaram minha roupa, vi que minhas panturrilhas, coxas e tornozelos também estavam queimados. Depois que desci do carro, cheguei andando rápido ao hospital, sem saber que minhas pernas estavam em estado grave.

Depois, descobri que tive entre 18% a 20% do corpo queimado, sendo as lesões mais profundas na coxa e tornozelo. O casal de amigos também se feriu: o homem queimou parte do rosto e das mãos; a mulher, os pés.

A UTI
Dei entrada no hospital no dia 15. de maio Assim que cheguei, a equipe médica fez curativos, aplicou pomadas e anestésicos. Logo fui encaminhado à Unidade de Terapia Intensiva (UTI). No dia seguinte, entre a manhã e a tarde, ei pela primeira cirurgia: raspagem, troca de curativos, aplicação de medicamentos.

Os primeiros dias são os piores. É um processo muito doloroso. A ardência, a queimação… É uma dor constante, inável. ei praticamente 24 horas por dia sob efeito de anestésicos.

No terceiro dia de internação, ei pela segunda cirurgia. Tive uma crise de dor logo que saí do centro cirúrgico. Foram 15 minutos de dor intensa, algo desesperador, que nunca havia sentido na vida. Não desejo isso a ninguém. Três dias depois do acidente, ainda lutávamos com complicações.

Marília, o irmão dela, Leonardo (que é médico em Porto Alegre), e a mãe dela avaliaram a possibilidade de virmos para o Sul, para o Hospital Nora Teixeira, na Santa Casa de Porto Alegre, que é referência em tratamento de queimaduras. O doutor Eduardo Chem, de Porto Alegre, já me atendia por vídeochamada enquanto eu estava em Brasília. Cinco dias depois do acidente, decidimos vir para cá, e dei entrada no hospital no dia 21.

Viemos em uma UTI Aérea. Meu cunhado nos acompanhou, junto com uma equipe médica. Durante o voo, precisei de medicação para dor uma vez, mas no geral foi tranquilo. Chegando em Porto Alegre, fui imediatamente atendido pelo Dr. Chem, que me tranquilizou e explicou o que seria feito. No dia seguinte, já ei por mais uma cirurgia, cercado pela minha família.

Em Porto Alegre, fiquei apenas dois dias na UTI, e depois fui transferido para o quarto. O Hospital Nora Teixeira é referência, e a equipe de enfermagem foi extremamente atenciosa e profissional. Comecei a sentir alívio das dores. Os procedimentos eram diferenciados, o que acelerou minha recuperação.

Além do tratamento e fisioterapia, começamos com a câmara hiperbárica, que simula uma pressão de 14 metros abaixo do nível do mar, permitindo que a gente respire um oxigênio 100% puro. Isso melhora a circulação e acelera a cicatrização. Fizemos quase todos os dias, sob recomendação do doutor. Isso me ajudou muito.

A recuperação
Recebi alta dia 4 de junho, vinte dias após o acidente. Desde que saí do hospital, sigo um cronograma rigoroso: medicamentos diários, idas à câmara hiperbárica (quase todos os dias), fisioterapia, consultas com dermatologistas. Meu dia é todo voltado à recuperação.

Sou muito grato ao apoio de todas as pessoas ao meu redor. Família, amigos, profissionais de saúde. Todos ajudaram de alguma forma, seja com apoio, com orientações ou simplesmente com palavras de conforto. O ambiente e o acolhimento fizeram uma diferença enorme no meu emocional.

Ninguém quer estar machucado. Quanto antes eu puder me recuperar, melhor. Estamos acelerando tudo o que podemos. O e da equipe de profissionais é fundamental. Me sinto privilegiado por estar em um local com tanta estrutura e cuidado.

Sou, antes de tudo, grato a Deus. Por não ter sido pior. Dentro do hospital, vi casos muito mais graves, pessoas que perderam dedos, orelhas… Eu me considero preservado. E me preocupo com o futuro, claro. Pergunto aos médicos se vou poder voltar a correr, jogar bola, treinar. A resposta é sempre muito positiva. Claro, vai levar tempo, vou precisar de muito tratamento, mas eles acreditam que vou voltar ao normal. O principal agora é evitar sequelas na pele e garantir que os movimentos sejam preservados.

Recebi e continuo recebendo muito apoio da comunidade do futebol. A relação vai muito além do campo. Amigos, jogadores, o pessoal do grupo do penta, da Inter de Milão… Todos mandaram mensagens. Renato Gaúcho, Dunga, Kaká, Juan. Também recebo muitas mensagens de anônimos e seguidores. Isso alegra o coração e dá forças para continuar. A energia positiva das pessoas é um remédio poderoso. E eu sigo, com fé e esperança, para um dia voltar a ser 100%.

*Em depoimento a Karolini Bandeira.

Como funciona a lareira ecológica? E como usá-la com segurança?
Também chamada de biolareira ou lareira a álcool, a lareira ecológica se tornou uma opção popular por ser portátil, não produzir fumaça e dispensar o uso de chaminé. Sem os devidos cuidados, contudo, pode ser perigosa. No mês ado, o ex-zagueiro da seleção Lúcio sofreu queimaduras após a explosão de um desses equipamentos.

A lareira ecológica funciona a partir da queima de álcool em reservatório próprio e exige um procedimento cuidadoso: uma haste metálica é molhada com o álcool, acesa com isqueiro e só então levada ao recipiente. Para apagar, basta fechar a tampa do queimador.

O funcionamento, aparentemente simples, esconde riscos graves como queimaduras, explosões e incêndios quando as recomendações de segurança não são seguidas. Confira seis cuidados orientados pelo Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro para usar o equipamento:

Nunca reabasteça com a lareira quente ou acesa: Mesmo que não haja chamas visíveis, espere pelo menos 30 a 40 minutos após o uso para que o equipamento esfrie totalmente. O vapor do álcool pode inflamar, ou até mesmo causar explosões, ao contato com calor.

Use apenas o combustível indicado pelo fabricante: Utilize álcool específico para lareiras ecológicas. Jamais substitua por gasolina, querosene ou álcool de cozinha — todos esses aumentam drasticamente o risco de explosão.

Mantenha longe de objetos inflamáveis: Posicione a lareira longe de tapetes, cortinas, móveis, sofás e outros objetos combustíveis. Também é importante manter distância de crianças e animais ao acender o objeto.

Não deixe a lareira sem supervisão: Nunca durma com a lareira acesa ou a deixe funcionando sem ninguém por perto. Além do risco de incêndio, a queima consome o oxigênio do ambiente, podendo causar asfixia.

Leia o manual e respeite os limites do reservatório: Siga rigorosamente as instruções do fabricante, especialmente sobre a quantidade máxima de álcool. O excesso pode causar vazamentos e emissão de vapores altamente inflamáveis.

Ventilação: Lembre-se de manter a lareira em um local ventilado, tendo pelo menos uma porta ou janela abertas.

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